Surgem unicórnios e investimentos bilionários. Pouco tempo depois, as layoffs assustam o segmento e fazem pensar: afinal, o que é preciso para alavancar o desenvolvimento das startups no Brasil?

Durante o CASE 2022, realizado em novembro, em São Paulo, a Dínamo promoveu debates em torno desta questão e com o foco nas políticas públicas e iniciativas que promovem o crescimento e a diversidade do ecossistema de startups no Brasil. Dentre os debates, um dos temas de maior interesse é a questão de Talentos em tecnologia.

Neste artigo você vai acessar parte do que foi discutido no dia 17 de novembro, durante o painel “Talento: Panorama e iniciativas de sucesso do setor público e privado”, participaram Álvaro Machado Neto (Learning Village e Singularity), Ana Paula Gaspar (especialista em tecnologias educacionais), Rafael Herrera Silvia (Sirius Education) e Vitor Del Rey (Instituto Guetto). O mediador do painel foi Felipe Matos, VC da Dínamo, que trouxe sua experiência como CIO na Sirius, presidente da ABstartups e fundador do StartupFarm, 1o programa de aceleração de startups do Brasil em 2010. 

Déficit de profissionais em STEM, desemprego e exclusão – Como chegamos aqui? Uma perspectiva histórica

Para compreendermos como chegamos ao atual cenário brasileiro, marcado pela grande demanda e baixíssima oferta de profissionais nas áreas de tecnologia, simultaneamente a um grande número de desempregados, e vemos grande parte da população negra, pobre e das mulheres excluídas do acesso à educação e recursos tecnológicos, é importante nos perguntarmos: como chegamos aqui?

Em busca de responder a essa questão, o debate realizado pela Dínamo, foi intencionalmente construído a partir de uma perspectiva histórica sobre a Educação brasileira. Quem nos guiou por esse caminho foi Ana Paula Gaspar, que além das credenciais já apresentadas, é também historiadora, mestre em Design de Serviços pela CESAR, e atual graduanda de Engenharia da Computação. 

Segundo Ana, “Em 500 anos de história pós-colonização, o Brasil tem 350 anos de escravidão, período no qual as pessoas negras foram totalmente excluídas do processo educacional, pois sequer tinham status de seres humanos, que dirá, de cidadãos. 

No período da República, surge o ensino superior como um projeto para as elites sócio-econômicas. Enquanto para os negros libertos saber ler não era sequer relevante, uma vez que as oportunidades de trabalho disponíveis para esse grupo eram, em sua maioria, atividades operacionais e que demandavam força física, o que, portanto, dispensavam instrução.

Já na primeira metade do século XX, começa-se a pensar sobre uma educação pública para todos, ainda que muito lentamente e marcada pela exclusão e cisão. É neste período que surge a distinção entre o bacharelado e o curso tecnológico e uma hierarquização entre as áreas do conhecimento. Emerge também neste período, a noção de que cursos bons são os de escritório e não os operacionais. Ou seja, a criação dos primeiros cursos já carrega em si, preconceitos e exclusões. Apenas no final do século XX, o Brasil alcançou a universalização da Educação, mas ainda não oferecia a mesma educação para todos” 

Emerge também neste período, a noção de que cursos bons são os de escritório e não os operacionais. Ou seja, a criação dos primeiros cursos já carrega em si, preconceitos e exclusões.

Ana Paula ainda acrescenta: “Então, no início da década de 1990, surgem as primeiras empresas de tecnologia no mundo e de lá para cá, cristaliza-se, ainda mais, a exclusão tecnológica das pessoas que ficaram historicamente à margem da educação. Hoje, formamos 17% de jovens pelo ensino técnico. E convivemos com o despreparo dos educadores para formar pessoas na educação tecnológica. Observamos atualmente, o fim da indústria no modelo vigente desde a Revolução Industrial. A nova indústria demanda profissionais com cada vez mais competências tecnológicas específicas. Mas ainda há, de forma ampla, uma visão equivocada de que quem vai para o ensino técnico é filho de operário e quem vai para o superior, é filho de rico”. 

Mas essa é a única visão possível? “Não. Não precisava, nem deveria ser assim! O técnico poderia ser uma oportunidade riquíssima de experimentação nas áreas mais aquecidas de mercado. E apesar do imenso desafio de criar políticas públicas em educação que tenham robustez e alcance massivo, é preciso também considerar a subjetividade do jovem, alcançar seu desejo para que a educação recupere seu prestígio junto a esse grupo que está iniciando sua vida economicamente produtiva.

É também preciso atualizar a visão de que estudar é algo da juventude e atuar na perspectiva do long life learning”

Diante desta relação entre Educação e Tecnologia, construída com tamanha desigualdade e perpetuada por gerações, quais as alternativas e iniciativas em curso no Brasil hoje em dia? Foi com essa questão em mente que os painelistas trouxeram para o debate, um pouco do que têm visto, vivido e realizado cada um suas jornadas de vida e carreira.