Pergunta para a rede: onde estão os homens brancos em posição de poder realmente comprometidos em combater o racismo e o machismo nas empresas do século XXI?
Senti falta dessas pessoas anti racistas e anti machistas nos dias 17 e 18 de novembro, durante a CASE 2022 (a 9a edição da Conferência Anual de Startups e Empreendedorismo, “atualmente o maior evento de encontro de startups da América Latina”)
É que durante esses dias, a Dínamo ofereceu ao todo: 10 painéis, 27 painelistas e 480 minutos de conteúdo presencial, que conectavam os temas startups – políticas públicas – diversidade e inclusão.
De forma geral, os painéis compartilharam políticas públicas e iniciativas da sociedade civil que ajudam a criar um ecossistema favorável ao desenvolvimento de startups. Mas não qualquer desenvolvimento! A luta é por um ecossistema mais diverso e inclusivo para pessoas negras e mulheres. Mas me decepcionei profundamente ao perceber que, salvo raras exceções, estávamos “pregando para os já convertidos”. Este foi um questionamento bastante destacado no painel “Equidade de Raça e Gênero nas Startups”, especialmente pela fala da Allana Cardoso, depois endossada pelas demais participantes: Arlane Gonçalves, Nalva Moura, Angelica Mari e Aline Ferreira.
Considerando o contexto geral do Brasil – apenas 5,8% das startups são lideradas por pessoas pretas e apenas 4,7% são lideradas por mulheres, sendo que 51,2% da população brasileira é formada por mulheres e 55,8% por pessoas negras (dados do IBGE), tendo a entender que o principal motivo da ausência de pessoas brancas e homens nos painéis é a realidade crua e doída: a tardia e persistente insensibilidade do ecossistema de startups para esse tema. Por ecossistema leia-se pessoas fundadoras, nível C, pessoas investidoras, aceleradoras, mentoras, colaboradoras, fundos, atores públicos – todes que não são pessoas negras ou mulheres, mas que estão em posição de privilégio e poder e podem fazer a diferença na luta por equidade de raça e gênero.
Em tempo, o compromisso com essas causas se faz por atitudes e palavras (porque elas também importam). Por exemplo, Rodrigo Kiko Afonso, presidente da Dínamo, deu a diretriz para que Diversidade e Inclusão fosse o pilar central de atuação da equipe em 2022. E Felipe Matos, vice-presidente da Dínamo, reafirmou e apoiou a implementação da diretriz. Assim, ainda em 2021, Arlane Gonçalves, especialista no tema, foi contratada para conduzir a construção de políticas públicas em D&I para startups e desde lá tem liderado importantes ações nessa direção.
Felizmente, eles também me trouxeram para a Dínamo em 2021 e, assim, posso participar do grupo criado por Arlane, o GT de Diversidade em Startups. São pessoas negras e mulheres especialistas em Diversidade, tecnologia, inovação e políticas públicas.

Como mulher branca que sou, minha participação inicialmente se concentrava em “apenas” escutar e escutar com o coração. Aos poucos, me senti à vontade para perguntar e refletir com as pessoas poderosas e generosas deste grupo. Intencionalmente, coloquei meus 20 anos em Comunicação a serviço de ajudar a expressar em palavras o pensamento dos meus colegas. E assim, sinto que estou agindo na direção de uma sociedade mais justa e equânime.
Mas não me sinto tranquila, pois não é suficiente. Desde 2018, frequento eventos, cursos e conto com colegas especialistas em D&I para me apoiar, mas nada me ensinou mais sobre o racismo e o machismo do que este grupo, ao qual serei eternamente grata. E uma coisa que eles me ensinaram muito bem foi sobre a urgência da transformação.
Pois bem, toda a riqueza deste grupo esteve presente na semana passada, na arena da Dínamo no CASE 2022. Os debates trouxeram dados, relatos, experiências reais, reflexões profundas e críticas. Falamos sobre o que nos trouxe como humanidade e como sociedade brasileira até este momento histórico em que estamos mergulhados em uma cultura racista, misógina, homofóbica, capacitista, etarista e violenta com todes os que não são ‘os normais’. Falamos também sobre como lidar, resolver, construir outras realidades possíveis para transformar a realidade dada. Mas quem deveria ouvir, ver e participar não estava lá.
Por isso, continua reverberando em mim um imenso desconforto e a sensação de urgência que o GT me deu de presente! É urgente a atuação de mais homens e pessoas brancas, na luta pela equidade de raça e gênero. Pessoas que, como eu e você, podem trazer mais homens e mais pessoas brancas para participar de discussões e ações como essas em todos os ambientes, mas especialmente, naqueles onde há muito recursos, muita visibilidade, muita potência de impacto, como é o ambiente das startups.
Afinal, o segmento das startups continua crescendo nos últimos 10 anos, mesmo diante das crises. Tem o poder de modificar profundamente os negócios e o consumo de todos os outros setores econômicos. Demanda por pessoas competentes em STEM, mas – ainda – não consegue olhar para as pessoas e suas necessidades.
Você, que atua no ecossistema, pode fazer a diferença ao tomar decisões, ou pressionar pessoas em sua organização na tomada de decisões; você pode escolher suas palavras e gestos, propor ações, estimular a mudança de mentalidade e comportamento por meio do diálogo e educação; você pode ser um bom exemplo do que quer semear.
MARINA QUEIROZ
Sim, você pode. E deve. O problema do racismo não é das pessoas negras. Assim como o problema do machismo não é da mulher. O problema é de quem se beneficia dessas estruturas. E o problema afeta a todes (ou deveria).
Por isso, conecte-se com sua capacidade humana de perceber o outro. Desafie-se a reconhecer a desigualdade ao seu redor e se inconforme. De fato, você tem motivos de sobra para se sentir desconfortável, pois a realidade não é boa para a maioria das pessoas. E enquanto não for bom para todes, não é bom para ninguém.
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Sobre a autora:
Marina Queiroz possui mais de 20 anos em estratégia de Marca e Comunicação, com foco em mulheres e negócios de impacto. Criou a Eh, Basta! comunidade para o desenvolvimento de mulheres maduras. Eterna estudiosa de D&I e desenvolvimento humano, na Dínamo ela contribui com conteúdos e eventos.